Olha eu aqui de novo!!! Vamos à primeira parte da entrevista com Samiz Thomaz, autor de Meu Caro H (o livro em que o autor tornou pública a sua experiência ao saber que era portador do vírus HIV) e Te Espero o tempo que for (livro em que o autor conta sua história com o amor da segunda parte de sua vida e toda dificuldade que encontraram por conta do HIV).
E não esqueça! Depois de publicar as 3 partes da entrevista, eu e Samir lançaremos uma promoção! Fiquem ligados! Primeiro, conheçam o SamirAntes de começar a ler a entrevista, nada melhor do que ver uma foto do autor. Gente, esse é o Samir:
Agora, a Entrevista - Parte 11 - Primeiro, queria fazer algumas perguntas sobre o Meu Caro H. Deve ter sido um divisor de águas lançar um livro autobiográfico sobre a entrada do vírus HIV na sua vida. Hoje, analisando tudo o que ocorreu depois disso, você acha que o lançamento do livro trouxe mais coisas boas ou ruins? Você sofreu muito preconceito? Ainda é difícil para você lidar com esse assunto?
É verdade, minha vida se divide entre antes do Meu caro H e depois. Na verdade, antes do hiv e depois dele. O que posso dizer, passados doze anos do diagnóstico da síndrome e dez anos da publicação do livro, é que a vida é um caminho sem volta. Sou existencialista até a medula, portanto acredito que somos aquilo que realizamos concretamente. A minha postura, passada a fase inicial do medo de morrer e de não poder estar ao lado das pessoas que amo, sempre foi uma postura de combate, de luta.
Antes de tudo, lutar para viver. Mas também lutar para manter a dignidade, para manter a autoestima em níveis aceitáveis, para enfrentar o preconceito que eu sabia que viria. E em última instância, lutar para continuar ao lado das pessoas que amo. Nesse sentido, o livro foi uma terapia para inventar a coragem. Quanto ao preconceito, de qualquer tipo, ele é fruto da ignorância de quem o pratica.
Nós vivemos num país culturalmente atrasado, portanto eu nunca tive a ilusão de que não fosse ser olhado de viés e até com piedade por algumas pessoas. Mas sempre lidei de forma corajosa e transparente com a síndrome e com o preconceito.
No caso do hiv, a primeira coisa que a pessoa diz é que você está com os dias contados. Pois é, há onze anos estou com os dias contados. Nesse onze anos, continuei trabalhando, fiz uma graduação de jornalismo, uma pós-graduação em ciências sociais, escrevi cinco livros e namorei por quatro anos uma garota interessante.
2 - Hoje, percebe-se que há muito menos tabu em relação ao vírus do que na época em que você o contraiu. Dá para levar a vida normalmente com o vírus, por conta do coquetel? Você sente algum efeito colateral ou fica com a saúde fragilizada às vezes? Penso que hoje a medicina avançou tanto que é possível ser soropositivo por décadas e décadas, vivendo de maneira absolutamente normal. Estou certa?
Sim, está certa. A Aids hoje é considerada uma doença crônica, ainda que bastante letal, mas crônica. Sempre pergunto à minha infectologista se ainda morre gente de Aids. Ela diz que sim. E não pouca gente. No meu caso, nunca tive efeito colateral e nem posso dizer que sou um modelo exemplar de paciente. Por diversas razões negligenciei a tomada do coquetel nesses dez anos e em razão disso estou na minha quarta medicação, indo para a quinta. É aquela história, às vezes você está tão detonado emocionalmente que não levanta para tomar o último medicamento da noite, ou esquece de tomá-lo.
E não tomar um dos componentes do coquetel é o mesmo que não ter tomado os outros, afinal o coquetel é uma combinação de drogas. Não recomendo que se faça isso. Se eu pudesse, não faria. Mas o aspecto emocional às vezes supera a razão. Eu vivo muito intensamente, apesar de ser um sujeito aparentemente pacato. No fim de 2007, cheguei à situação de não haver no mercado brasileiro uma medicação que fizesse efeito no meu organismo. O vírus havia criado resistência contra todos eles.
Cheguei a tomar por um mês uma medicação autoinjetável, importada via autorização judicial, o que no meu caso não funcionou. Quem leu Meu caro H tomou conhecimento da minha ojeriza por agulhas. Injetar a medicação em mim mesmo, fala sério... Estou prestes a iniciar uma nova medicação. Nesse sentido, me considero uma pessoa de sorte.
3 - Como é a relação com sua filha? Você passou a adotar cuidados especiais na sua casa depois de descobrir que era soropositivo, certo? Essa situação acabou trazendo pontos positivos em relação à maneira com que você criou Joyce? Vocês são amigos, falam abertamente sobre todos os assuntos? Acha que seria assim se nada disso tivesse acontecido?
Minha relação com a Joyce é ótima. Ela é o meu grande estímulo. Sempre que a barra pesa, a lembrança dela é que me segura. Ela é fruto da educação que eu e a Naide demos pra ela. Ou seja, cresceu entre livros, ouvindo muita MPB, rock, jazz, pop rock, ouvindo discussões sobre política, arte, etc. Disso resultou uma menina de cabeça aberta, generosa e inteligente.
A Aids nunca fez a menor diferença para ela. Neste momento ela está envolvida com a graduação de desenho industrial que faz e com o primeiro emprego na área de design gráfico e me liga todas as noites para contar as novidades. Uma vez por semana vou ao Mackenzie para tomar um café com ela. Saio de lá renovado.
4 - Antes de saber que você era portador do vírus HIV, você tinha preconceitos, era uma dessas pessoas que achava que ser soropositivo era um bicho de 7 cabeças ou já era bem informado e encarava a doença como encara hoje?
Quando surgiu, na década de 1980, a Aids era um terror. Tomar contato com um soropositivo, conforme eu narro no Meu caro H, era um acontecimento marcante. Você olhava a pessoa sabendo que ela já não existiria dali a algum tempo.
Se fosse um soropositivo sintomático, ou seja, que já estivesse com os sintomas explícitos no corpo, aí o pavor se multiplicava. Eu tinha sim preconceito, embora tivesse tido contato apenas com as duas pessoas que menciono no livro – que morreram em seguida, aliás. Mas meu preconceito se restringia a essa forma de pavor. Com o tempo, ao ver que meus ídolos da cultura pop – principalmente os cantores Cazuza, Renato Russo e Fred Mercury e o escritor Caio Fernando Abreu – tinham Aids, o medo logo se converteu em solidariedade.
5 – Bom, agora vamos falar do seu outro livro, que trata da Aids, Te espero o tempo que for, lançado em 2009. Nesse livro você narra o namoro tumultuado com uma garota de 16 anos que conheceu na internet. Você e a Liliane ainda estão juntos?
Sim e não. Nós terminamos há coisa de dois meses. Era previsível e esperado diante de um namoro tão cercado de tabus, preconceitos, sem contar a questão da distância – ela mora na região de Botucatu, no interior de São Paulo. Por outro lado, ela me liga todas as noites pedindo colo, o que me faz um bem danado (e imagino que também a ela), porque nós temos uma ligação muito forte.
A questão é que nossas vidas têm ritmos diferentes. Ela está com 21 anos e faz o terceiro ano de odontologia na USP. Eu estou numa fase mais voltada para o trabalho. Não sei como chamar esse tipo de relação. Não é mais namoro. Mas também não é só amizade.
Ontem mesmo ela me convidou para ir para a Itália no ano que vem. Eu disse que só se ela fosse para Buenos Aires comigo este ano. Ela aceitou. De minha parte, ela é o grande amor da segunda parte da minha vida (a da primeira parte foi a Naide). E eu só tenho a agradecer pela relação de quatro anos e meio que tive com ela. É uma garota muito especial.
Adorei a primeira parte da entrevista. E vocês?
Deixem seus comentários! Segunda-feira tem a parte 2!! :)